sexta-feira, 1 de março de 2019

Coração Valente

Texto escrito aos 15 dias do mês de novembro (2017). Precisava escrever a descrição de uma pessoa para a disciplina de produção de texto... não pude evitar as palavras que se apresentaram:


Às vésperas do Natal de 2016 meu namorado infartou. A fragilidade da vida é um dado de fato da nossa humana existência. Sabemos disso desde sempre. Mas sabemos “assim”, como sabemos que o universo provavelmente nasceu da grande explosão do Big Bang. Saber não equivale a compreender. 

Naquele Natal, passei do saber ao experienciar. Na época, era um namorado recente; mas contrariando minhas estatísticas amorosas, ocupava um lugar de destaque na minha vida e na minha família, já havia me acompanhado até Santa Cruz, cidade de onde venho, e conheceu minha mãe e minha doce azeda avó (não costumo apresentar nem meus amigos para minha vó).

A tal experiência deu-se durante uma jantinha a dois lá em casa, ele havia cozinhado um risoto de camarões realmente delicioso e, de repente, se pôs de pé com uma expressão no rosto que me deixou em estado de alerta, girou o tronco para um lado e outro, olhou-me muito sério e disse pela segunda vez naquela noite: não estou bem, estou sentindo algo estranho no peito.

Em Santa Cruz do Sul, eu havia trabalhado três anos na área da saúde e cursado um semestre de enfermagem; desde então, há momentos em que uma sirene dispara dentro de mim. Aquele foi um desses momentos. Situações assim nos colocam diante da fragilidade da vida e da força do inesperado. Pode ser um furacão, um terremoto, uma enchente, uma bala perdida. Ah! Mas isso só passa na televisão dirão alguns. E que tal pisar em falso e quebrar um pé ou uma perna, ter a visão ofuscada pelo sol e acabar atravessando no sinal vermelho e...

Os momentos “quase” também contam, nos dão aquele susto, a vida segue porém: o ônibus que buzina em tempo e a gente volta para a calçada são e salvo, apesar das pernas parecerem gelatina; um acidente de carro bem na tua frente, mas que não te atinge; o freio da bicicleta que falha numa lomba como a da Lucas de Oliveira, quadras antes de cruzar com a Protásio; um infarto no coração de quem a gente ama.

Falando em amar, o músculo cardíaco dele é resistente, em repouso bate em torno de 64 vezes por minuto. A cardiologia diz que assim é saudável. Talvez por isso me possa valer de verbos conjugados no presente.


Ele é um cara magro. Tem um físico parecido com o meu. Perto dele nem me sinto miúda. Me sinto bem. Nos finais de semana, quando não tenho paciência de pensar em possibilidades de roupas que vou precisar para nossos momentos de lazer, caso não volte para casa, costumo usar suas camisetas e bermudas.

Ele é uma pessoa calma, tem a serenidade de um lago mesmo em dias de vento; nunca levanta a voz e, durante uma discussão, escolhe bem as palavras e jamais apela para termos ofensivos nem se fecha ao diálogo. Gosto disso nele, transmite maturidade.

As análises do seu sangue demonstram parâmetros de colesterol, triglicerídeos e glicemia dentro da normalidade. Não bebe, não fuma e faz exercícios. A pressão arterial tende a ser baixa. Ele tem 45 anos, se sabe que essa idade é a faixa de risco para potenciais cardíacos. Era o único índice contra, já que até então nem imaginávamos, mas por um problema genético e silencioso, ao longo desses 45 anos de vida saudável, a pouca gordura ingerida, ironicamente, foi se depositando nas suas coronárias até o ponto de entupi-las.


Foi aí que descobrimos, naquela noite e ao longo dos últimos meses, que a vida não está nem aí para os nossos bons índices e parâmetros médicos, esses são uma invenção humana. Já a vida não é uma invenção do homem; o homem é que é um produto da vida. Mesmo assim, os índices nos favoreceram. Deve ser por isso que ele não sucumbiu àquele infarto e tive a oportunidade de dizer que o amo.

Durante aquelas primeiras horas em que a serenidade dele se foi, e, ao longo dos três meses de repetidas internações, 4 cateterismos e a implantação de 5 stents, mantive a calma. A calma me ajuda a tomar a iniciativa e a agir rápido, como toda situação de risco requer; além de manter as coisas como elas parecem ser: irreais. Também ajuda a responder várias vezes as mesmas perguntas: - Não, ele não tomou Viagra, já expliquei isso para o teu colega; sim, eu compreendo a importância dessa informação.

Até mesmo quando o médico disse claramente “ele está infartando, mas não conseguimos entender o porquê e ele corre sério risco de vida”, só pude pensar: é de morte seu ignorante, risco de morte.

Risco que corro, corremos, todos os dias. Da hora em que me levanto da cama - ou mesmo antes disso -, até a hora em que vou dormir - ou enquanto durmo - posso morrer. Podemos morrer. Aprendi, com as coronárias dele, que não estamos a salvo. Nossa juventude é mera ilusão.


Desde o Natal passado, todos os dias me prometo que permanecerei calma; a calma mantém, para mim, as coisas irreais. Mas basta ele passar algumas horas sem dar notícias para a realidade daquele coração fazer o meu viver aos pulos. Porque como disse João Cabral de Melo Neto, “a medida do homem não é a morte, mas a vida”.

sábado, 19 de janeiro de 2019

O intruso



Escrevi em 26 de setembro de 2017

Na minha casa não entrava bicho. Até que encontrei, pela rua, o gato mais peste e mais fofo que já conheci. 

Sou metódica e organizada; faço tudo igual, todos os dias. Aquela coisa toda: saltar da cama, café da manhã, ritual intestinal, um banho rápido, vestir-me, arrumar a cama e sair. Todo dia. Feito máquina. 

E não mexa na minha rotina, isso desorganiza meu dia, altera meu humor, provoca atrasos. Naquele dia eu mesma cometi o erro: mudei o trajeto. Permiti que a preguiça me convencesse a pegar um ônibus, deixei Clotilde em casa - ela tinha um pneu mal calibrado - e fiz um trecho a pé. 

Numa esquina perto do trabalho, minúsculo, sujo e assustado lá estava ele e exigiu atenção com toda aquela ausência de medidas e me intimou com fortes, insistentes e agudos sons felinos.

Quem segue muito a rotina e é todo certinho, anda sempre na linha, reconhece rápido uma ordem e nem sempre dá tempo de questionar-se se obedecê-la ou não: peguei-o. 


Segui com a rotina: dormir, acordar, tomar café, usar o banheiro, tomar banho, vestir-me, arrumar a cama e sair. Tudo intercalado pelas exigências daquela criaturinha que resistiu e venceu todas as minhas tentativas de expulsá-lo da minha casa. Me fez vaciná-lo, incluir suas despesas no meu apertado orçamento e acrescentar muitas tarefas à minha rotina doméstica. Entre o acordar e o sair preciso limpar a caixa de areia, consertar as coisas que ele destruiu, limpar o que ele sujou, jogar a bolinha de papel pra ele correr atrás e trazer de volta pra mim e, fundamental para o andamento do dia, coçar suas orelhinhas e o queixinho. 

Em pouco menos de três meses a criatura trouxe reforços. Concluiu que sozinho havia abalado pouco aquele ambiente quase estéril em que eu vivia. Agora, a coisa toda já começa antes de sair da cama, pois só posso levantar depois de ganhar um beijinho de borboleta - nariz com nariz - uma massagem nas costas e coçar seis orelhinhas e três queixinhos, um de cada vez e em ordem. Só consigo chegar ao banheiro depois de atirar, pelo menos uma vez, a bolinha de papel, abrir a janela para darem aquela espiadinha lá fora e deixar um fiozinho de água na torneira para tomarem seus golinhos lambidos. Só tomo meu café depois de encher os pratinhos; e, o banho, só depois que limpo a caixa de areia, muito maior agora. A cama já nem arrumo mais, eles gostam de se aconchegar entre as cobertas enquanto estou fora.


Quando volto, se o dia foi difícil, a irritação ou frustração antes tão constantes, agora dissolvem-se ao toque mágico de uma daquelas 12 patinhas. A tristeza já nem entra mais lá em casa, desistiu depois que me encontrou rolando pelo chão às gargalhadas enquanto era impiedosamente pisoteada, mordida e arranhada em dose tripla de fofura. 

Desde que este gato exigente me encontrou na rua, minha rotina ficou mais puxada, tenho muito mais o que limpar e arrumar, mais despesas e mais tarefas. Mas me pergunto qual relação não dá trabalho? 

Sempre ouvi falar que é da natureza humana a resistência à mudança, em geral não gostamos de sair da zona de conforto; admito que, de fato, costumo não gostar, ao menos não durante o processo. Porém, passei de na minha casa não entra bicho, para não mexe com meus gatos. 

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

O fio de ouro da amizade e do amor


Fabiana e Fabio, quero falar sobre amor e amizade. Nós três entendemos bem disso, não é?! Então, falarei por nós três.

Fabiana & Fabio - Love Story | Veja e emocione-se

Me ensinaram que a vida é tecida por um longo fio de ouro que vai costurando acontecimentos “aleatórios” uns aos outros. Acontecimentos que podem ser considerados banais a um olhar desatento ou “meras coincidências”, até que são costurados pelo fio de ouro.

A amizade é o elemento que mais dá tenacidade ao fio de ouro. Os acontecimentos entrelaçados pelo fio que é fiado pelo tear da amizade, tornam-se marcantes e definem nossas escolhas. Costuram as mais belas histórias das nossas vidas.

Em 2001, lá em Santa Cruz, estava descobrindo as maravilhas da internet e o fabuloso chat do bol...

Em São Paulo, cursando mecatrônica e matando preciosas horas de estudo no chat, estava um guri fofo e japonês.

Em Porto Alegre ou Brasília, Fabiana ainda não existia pra mim.

Em 2006 ela apareceu, doida. Ria à toa. Levava tudo na galhofa. E me acolheu. Tornou-se minha amiga antes que eu percebesse.

Então, em 2010, Santa Cruz, Porto Alegre e São Paulo se encontraram. O fio de ouro costurou os retalhos.

Acredito que a amizade é a mãe do amor. É ela quem cuida, acalenta e o alimenta, para que cresça forte e saudável.

Nós três, a partir daquele encontro, cuidamos da nossa amizade. Não éramos mais apenas duas duplas. Viramos um trio incrível.

E o fio de ouro tecido pela amizade seguiu costurando a vida e alimentando o amor. Transformou meus dois amigos em um casal. E a mim... Bom, eu ganhei uma linda missão: sou madrinha.


E como madrinha, ou como gostamos mais de me intitular, “Cupido Oficial”, me emociono e me orgulho de fazer parte desta união.


Em nome de todas as madrinhas e padrinhos com quem compartilho essa alegria e, tenho a honra de representar, desejamos uma vida plena e abençoada, ancorada na mãe amizade e no seu filho, o amor.

Madrinhas e Padrinhos Fabi&Fabio

Estaremos sempre aqui, felizes e comprometidos com a nossa missão de madrinhas e padrinhos. E, como tais, estaremos sempre por perto. Na alegria e na tristeza, até que o novelo do nosso fio de ouro chegue ao fim. 

quinta-feira, 26 de março de 2015

Aniversário de Porto Alegre


Há nove anos troquei as tardes úmidas cheirando a tabaco pelo frenesi de Porto Alegre, que já nem acho mais tão frenético assim... E hoje, minha Porto Querida Alegre, estás de aniversário.

Nossa relação já é tão íntima que até voltei a pedalar. Não mais uma aro 24, que era perfeita para minhas pernas curtas nas ruas da minha Santinha, mas uma bici grande, como grande é a exigência das tuas ruas movimentadas.

Já ando por aí à noite, até sozinha. Não pego mais ônibus errado. Não me choco mais com o fato de não enxergar a outra esquina por causa da quantidade de cabeças fechando minha visão.  Já perdi boa parte do meu sotaque, depois de tanta galhofa dos teus filhos.

Aprendi a frequentar e amar a Redenção. Meus sábados e domingos têm outro sabor quando estou jogada na grama, admirando teu povo, enquanto sorvo meu chimarrão.

Quando estou fora e me perguntam “de onde tu és?” eu digo que “sou de Porto Alegre!“ Porque és a cidade que escolhi pra superar meus desafios e realizar meus sonhos.

É verdade que eu seria mais feliz se a tua Protásio tivesse corredor até o fim. Se houvesse ciclovias sem fim... Se o teu Centro fosse mais bem cuidado. Se o teu Guaíba fosse livre de poluição. E, se as diferenças sociais não fossem tão gritantes entre os teus filhos. E nem vou falar do clima... Quatro estações em uma... Mas ainda assim, és a cidade que carrego no meu coração.

Porto Alegre, o aniversário é teu, mas o presente é meu. Parabéns pelos teus 243 outonos. Obrigada por estes nove em que me fizeste melhor.

terça-feira, 30 de setembro de 2014

É noite de Rock and Roll em Carlos Barbosa bebê!


Terça-feira, noite úmida e fria, boa pra ficar debaixo das cobertas vendo filme e se empaturrando de pipocas… Não na opinião dos barbosenses. 

Em Carlos Barbosa, minha nova morada, uma noite de terça fria e úmida é perfeita para a deliciosa mistura de uma orquestra e o bom e velho rock and roll com salão paroquial lotado. Decoração pontual: 3 super motocas deslumbrantes dando aquela cara de rebeldia típica do ritmo proposto. 

Quando eu fiquei sabendo foi assim: noite de rock, na terça-feira, em Carlos Barosa, no salão paroquial. Esperava de tudo menos o deleite que foi assistir ao espetáculo “Orquestra Municipal de Carlos Barbosa apresenta uma noite de Rock” na regência do Maestro Dirceu Andrioli e com um time de convidados de talento e peso internacional. E só pra ficar melhor 3 convidados mirins, fofos e talentosos. Foi irado! 

E a platéia super heterogênea. De bebês de colo a velha guarda da cidade. De autoridades a gurizada do fundão. 

Em poucos dias Barbosa já surpreendeu de várias formas. A noite de hoje foi um presente pra quem (eu no caso) às vezes acha que foi loucura sair de Porto Alegre e se meter no meio da “gringaiada”.

E adorei a espontaneidade do maestro que disse “fico muito feliz de fazer um concerto assim pra tanta gente”. Eu também maestro, fico super feliz de assistir um concerto assim com tanta gente. E na hora do bis ele não se fez de rogado e “atendendo a milhares de pedidos, literalmente” fechou a noite com chave de ouro. 

E maestro, pode ficar super satisfeito, porque ao final do concerto proporcionaram uma agradável “Noite de Rock”. 

terça-feira, 20 de maio de 2014

Encontros e despedidas


Desde a primeira vez que viajei sozinha que sinto esse fascínio pelo viajar. Lembro-me bem da sensação de entrar em um ônibus a noite, na minha cidade, e pela manhã estar “tão longe” de casa. Sai do ônibus como quem sai de uma máquina do tempo. Fiquei encantada. Era como se o mundo tivesse se aberto pra mim. E eu para o mundo.

Fui para a cidade de Joinville, que é bem maior que Santa Cruz do Sul. Não era o mundo, mas a sensação ficou dentro de mim. E foi essa sensação que me levou a atravessar o Oceano Atlântico anos mais tarde.

Foi mágico entrar em um avião à noite, em Porto Alegre, e ver a cidade lá embaixo me dizendo: vai e doe-se a essa aventura; e pela manhã (que aí já era a tarde, pois eu viajei para o futuro) estava lá do outro lado do mundo...

Estas experiências me fizeram entender que viajar é relacionar-se. Doar-se. Doar o coração para novas aventuras, culturas e, o melhor de tudo: pessoas. Pois a cada viagem que faço - curta ou longa, isso não importa - o que fica impresso na memória e no coração são os encontros. As amizades que nos preenchem de amor e ao mesmo tempo deixam um vazio pelo adeus de cada nova despedida. 


Partire è un po’ morire... E chegar é sempre nascer de novo.

domingo, 6 de abril de 2014

Meus pequenos grandes sonhos: Cambará do Sul





Eu queria, tava precisando conhecer novas pessoas. Realizar mais um dos meus tantos pequenos grandes sonhos (minha lista é grande).

Eis que a oportunidade bate a porta e eu abri. Senhoras e senhores fui a Cambará. Senhoras e senhores dei uma passeadinha (é bem mais curta do que eu imaginava) e fui pro canyon ver a beleza da mãe natureza.

Belas paisagens, água gelada, vacas, ovelhas, penhascos, céu azul. E o melhor: pessoas!

Maravilhosas pessoas.

Queria me reabastecer, me reenergizar. Ver um dos “meus” tantos lugares que preciso ver antes de morrer. Cambará tá na minha lista há mais de dez anos.

Os mais chegados dizeram: sua doida, vai sair com um grupo de desconhecidos? Nem sabe quem são, pode ser perigoso. Estranhos, penhascos...

Realmente corri muitos riscos:
- de pegar uma crise de nova energia naquela água gelada, meus pés não senti por alguns passos...
- de fazer novas amizades (e parece que fiz uma bem especial)
- de me surpreender com o ser humano;
- de ser acolhida e poder acolher;
- de rir. Muito;
- de me sentir, de novo, inteira. Juntei os pedaços que estavam meio soltos.

Realizei mais um dos meus pequenos grandes sonhos e fiz mais uma família: a da aventura.

Assim deveriam ser todos os domingos. Oportunidades para nos reencontrarmos com nós mesmos e com os outros. E reabastecer as energias para mais uma semana nessa vida louca que levamos e nem sempre sabemos por quê.

Faz tempo que digo que só posso ser eu com o outro. E neste caso foram muitos outros.
Obrigada!

sábado, 22 de dezembro de 2012

nas nuvens...



(..) E lá estaremos nós com os pés no chão. Mas encostando o céu com a palma das mãos (...)


Lá no alto, aqui da vista da minha escada, se vê Vallombrosa. Um baita morro. Bem alto. Lá sempre neva antes, sempre chove antes e sempre vejo nuvens cobrindo o morro.

A minha constante pergunta é: se eu, nesse momento que vejo aquela nuvem enorme cobrindo metade da montanha de Vollombrosa, subir lá no morro, vou ficar dentro da nuvem ou é só ilusão de ótica?

Hoje pela manhã, soube, assim sem querer, que estava dentro de um dos meus sonhos. E não tinha a mínima noção disso.

Tenho vários pequenos grandes sonhos. Tantos já realizei e tantos outros sei que ainda realizarei. Mas a alegria de me encontrar dentro de um deles... assim, de repente, sem saber, é imensurável.

O tempo aqui é feio, cinza, céu baixo, feio.

Achava isso, até a manhã de hoje.

As 10h30m tinha sol e pensei: Uau! bella giornata.

Quando desci pro almoço, às 13h, tudo cinza e fechado de novo. Como é possível que a neblina apareça depois do meio dia? Não é assim que conheço a neblina.

E ali, às 13h, descobri a verdade que mudou a visão do cinza feio. Não era a neblina, era uma nuvem. Eu estava dentro de uma nuvem.

Tantas vezes me peguei pensando como seria estar dentro de uma nuvem... Estava dentro de um dos meus tantos pequenos grandes sonhos.

E todo aquele cinza me pareceu tão esplêndido.

Descobri que estava dentro de um dos meus sonhos e nem sabia disso. Estava dentro de uma nuvem...

Loppiano foi envolvida por uma grande nuvem e eu acreditava que era névoa. Mas pra minha sorte, o Professor Rondinara estava por perto e me contou o segredo: Patricia, não é a névoa, estamos dentro de uma nuvem.

Meu Deus! Estamos dentro de um dos meus sonhos!

Descendo a Incisa comprovei o fenômeno. Lá embaixo, em Incisa, encontrei o céu aberto. Olhando pro alto, em direção a Loppiano, uma grande nuvem cobria tudo. Exatamente como quando olho pra Vallombrosa. Não era ilusão de ótica.

Mais tarde sai de bici com o Gabriel... de repente olho a manta negra que protegia o meu pescoço e parei o mundo. Parei a magrela. Parei o guri. Olhei minha manta negra e quase gritei: Gabriel! Minha manta está molhada de nuvem!

E a canção do Moska me disse: Tudo é possível, não há nada que se possa deter. O que era impossível acaba de acontecer...

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

...dopo un anno


Fachada do Istituto

Passou-se 1 ano letivo. Há dez meses sai de casa com algumas malas e muito otimismo (sempre tive tanto, não sei bem de onde vem). Cheguei em Roma. E depois de 3 dias, ao meu novo endereço: Istituto Universitario Sophia.

Por mais que tente, não posso explicar com exatidão, o que é esse lugar tão particular.

Me avisaram que seria a experiência mais diversificada, rica e profunda que jamais vivi. Eu disse: Ah! Legal. Mal podia imaginar.

Agora tento contar um pouco desses meses. Compartilhar o que vivi, senti, aprendi e também sofri. 

Foi um projeto de muitas, nem conheço todas as pessoas que se envolveram nessa minha aventura. Mas mesmo sem conhecer seus rostos, quero dividir com todos. Àqueles que conheci pessoalmente e pude dizer muito obrigada e aos anônimos que participaram de toda a maluquice que foi agosto passado e as novas que apareceram no percurso, quero enviar essas linhas e dizer-lhes ao menos um pouco o que foi il primo anno di Sophia.


Vita e studio!

Durante uma tarde de estudos, a Cara (das Filipinas), quis fotografar o chimarrão pra mostrar pros seus amigos

Duas palavras de uma abrangência imensurável. De lições de filosofia e ética que abalaram minhas (acreditava) sólidas bases a momentos em casa como a limpeza de um exaustor imundo que me ajudaram a entender a lógica de Parmenide

Cozinhar, limpar, arrumar, receber, se (des)entender com as colegas e compreender o pensamento de Aristotele. 

Depois de uma aula de Antropologia ed Etica della Persona, decidir abrir o coração a uma paixão que se apresentava e até ali tinha decidido ignorar, afinal, meu objetivo era só estudar.

Chorar, rir, brigar e se desculpar, administrar os problemas que ficaram no Brasil e ter um exame pra fazer. Tudo no mesmo dia. Isso é vida e estudo. Com uma pitada di pazzia

Abrir mão dos “meus saberes”, das minhas certezas (eu sempre tive tantas...) para me colocar no lugar do outro. 

Encarar o medo do escuro pra participar de uma festa, um jantar ou pra acompanhar uma amiga até a cidadezinha mais próxima. Quase enfartei de medo algumas vezes, mas cheguei.

Ouvir... e calar. 

Abrir-se. E dói. As vezes dói muito. Mas no quarto ou mesmo na cama ao lado saber que tem alguém que para tudo e te ampara. Te consola. Sem precisar pedir por isso. É tão reconfortante. 

Jamais imaginei estudar teologia. E imaginava menos ainda me emocionar com as Cartas de São Paulo. Menos ainda entender e encarar um conflito interno e antigo estudando para o exame. 

Foi o ano mais intenso, ambíguo e bonito dos meus jovens 30 anos. E ainda tem mais um.

As disciplinas, as diversidades etnoculturais, a vida em comunidade... tudo isso posso contar episódios, dar exemplos, relembrar histórias. Mas a mudança que tudo isso provocou dentro de mim não é possível explicar. Algumas só me dou conta depois de um tempo ou quando um dos colegas me fazem perceber. E provavelmente muita coisa ainda nem me dei por conta. Amadurecemos juntos. 

E é tão cansativo. Um tipo de cansaço que nunca havia provado antes...

Dói dentro dos músculos. Às vezes tenho a impressão que todas as minhas células precisam de repouso. Desejo ter um botão de desligar. Logo depois, vem uma energia, uma recarga desconhecida e consigo ir adiante mais uma semana. 

Algumas vezes fiz todo um esforço pra entrar na lógica da casa, da vida em comum, me adaptar e de repente, quando pra mim fazia sentido e superava e até achava melhor, tudo mudava de novo. Me desiludi muitas vezes. Desisti tantas outras. Quis não me importar...

Mas afinal o que se aprende ao desistir? E recomecei.

Tem vezes que tenho a impressão que todos os sophianos são meio loucos. Quase como se fosse um pré-requisito pra vir estudar aqui. Eu mesma nunca me considerei muito certa das idéias. Depois me lembro que na verdade vivo numa pequena amostra do que é o mundo globalizado, com uma super vantagem: todos os loucos sophianos estão tentando. Dão o seu melhor. 

No “'mundo real” tantos já desistiram. 

Minha Turma

Pensando lá no começo, nos primeiros dias me lembro de haver escrito um e-mail:

Felipe, é meio estranho o que vou te dizer, mas excesso de simpatia irrita. Esse povo aqui é muito fofo. Sempre querendo agradar, perguntando mil vezes se preciso de alguma coisa. Me sufocam”.

E eu precisa: de espaço. 

Quanta ignorância a minha. Agora a “miss simpatia” tantas vezes, sou eu. É meio contagioso. 

No fim da primeira semana houve uma festa. Misturei noites mal dormidas com fuso horário, violento processo de adaptação com uma pitada de comida estranha acrescentado de um copo de caipirinha made in Italy. O resultado foi uma rebelião hepática. 

E toda aquela simpatia internacional foi o melhor e mais poderoso remédio que já me foi receitado. Acostumada a ficar doente sozinha no meu solitário apartamento, me vi rodeada por seis doces cuidadoras. Cada uma a seu modo me curou. E me senti culpada por achar tão insuportável tanto carinho. E confessei e pedi desculpas por algo que elas nem sabiam, mas que serviu pra me fazer crescer.

A loucura coletiva, como chamamos por aqui, começa a me parecer a fórmula para uma vida repleta de pequenos belos momentos. Rica e emocionalmente saudável. 

Quisera poder transferir para o mundo e transformá-la em cura coletiva. Porque tem esse poder, o de curar. Tem curado meus medos, minhas inseguranças, minhas grosserias, fragilidades, minhas angústias.

Consigo ser eu mesma. E melhor que antes. Às vezes pior. Mas me aceitam mesmo assim. Me amam mesmo no dia em que se eu pudesse, me mandava embora. 

La pazzia studentesca

No meio a Cara, das Filipinas e ao lado a Thamires, brasileira. Estavamos fazendo terapia ocupacional em grupo como medida preventiva da loucura coletiva no período de exames...

Foram 23 cursos entre teologia, filosofia, sociologia, politica, ética, economia e língua italiana.

As notas aceitas vão de 18 a 30lode. Até agora não entendi bem che cavolo sia questo lode, mas eu tenho 1 :-) 

Os cursos foram divididos em módulos e alguns foram semestrais. Pra mim, o mais estranho é que em período de exames não tem aulas. E não é obrigatório fazer o exame na primeira sessão, é possível fazer mais adiante. Como assim? Que moleza é essa? São 3 ou 4 semanas ou mais, depende da sessão, exclusivamente de exames. E o povo pira no cabeção. Ficam super estressados, reclamam do mínino rumor dentro de casa, comem tudo o que encontram pela frente no melhor estilo “gafanhotos atacam a lavoura” e recusam todo e qualquer convite, afinal precisam estudar para os exames. 

concentração... p.s. olha o vinho ali na mesa!

Na primeira sessão achei graça de tanto estresse. E no fim de semana bem no meio da sessão, fui passear. Bologna e Venezia. Ah Venezia! A cidade mais romântica do mundo e o guri mais fofo... Mas essa história só conto pessoalmente.

Na segunda sessão me estressei com o estresse da galera. Tava um frio de “renguear cusco” e não conseguia sair de casa. Neve, vento e todos os ingredientes do inverno europeu. Pra uma gaúcha esquisita como eu, que não gosta de carne muito menos de frio, depois que passou o primeiro encanto com a neve, foi um período duro. 

a neve é linda, mas confesso que estava de joelhos...

Na terceira, só tinha uma prova pra fazer. Porque afinal não deixei de ser “cricri” e fiz os exames sempre na primeira sessão em que eram oferecidos e me fui viajar... me mandei mesmo. Fui conhecer Paris (eu e o guri mais fofo) com mais um colega super estudioso que também não tinha exames pra fazer. O povo estressado “estudandinho” e eu passeando pela cidade das luzes. Um luxo pelo preço de uma passagem a minha querida Santa Cruz do Sul. Imperdível. 

Na quarta, e pra mim, última sessão de provas do primeiro ano, estudei com dedicação. É já verão. Pude ir sentar na grama, embaixo de uma árvore com meu chimarrão e estudei mesmo. Sozinha ou com um dos meus colegas mais queridos estudei como nos velhos tempos de Famecos. Achei o equilíbrio. Pecado que na próxima sessão estiva de exames não terei mais nenhum pra fazer.

Preciso dizer que estudar teologia pra quem foi apelidado pelo Piero Coda de “miss credente” foi um desafio difícil, doloroso e muitas vezes me revoltei. Cheguei a ter momentos de criancice e não fui à aula. Achava um absurdo. Em outros momentos me resignava. Em outros, quando me permitia baixar a guarda e ouvir... Me chacoalhava por dentro. 

Foram 6 disciplinas. È tanto. Forse troppo. Mas o que não mata fortalece. E como dizia meu avô, saber não ocupa lugar. E, confesso, mas não contem a ninguém, depois da disciplina sobre Marco, li todo o evangelho, mesmo depois de ter feito o exame e agora estou lendo o Matteo. No meu ritmo, mas estou lendo... 

Descobri que a filosofia não é tão abstrata quanto parece e que os estudiosos de lógica tantas vezes têm uma linha de pensamento que se pode chamar como quiser, menos de lógico. 

O Leibniz, por exemplo, costumava dizer:  Quando due persone saranno in disaccordo su un punto qualsiasi, potranno sedersi a un tavolo e dire: calcoliamo. Sul risultato di un calcolo il disaccordo non è più possibile. Porém brigou com Newtom até o fim pela autoria do cálculo infinitesimal. Esqueceu de chamar o Newton pra sentar e calcular...

Algumas disciplinas simplesmente derretem o cérebro. Outras te tiram o chão e não devolvem mais. Na aula do professor Baggio andei perdendo uns pedaços meus que até hoje não reencontrei. Talvez não me façam falta. 

Sophia te destrói. Te desmonta, desmancha tudo. Pedra por pedra. E depois reconstrói. 

Essas férias têm sido um espaço pra refletir. Pensar sobre tudo o que aconteceu. Me perdoar pelos erros e sentir saudades... Muitas saudades!

Meus amores estão no Brasil e nos Estados Unidos. E eu aqui... sentada olhando o movimento (dentro de mim) e tentando por ordem nas emoções que agora não mais me chacoalham, mas me acalentam... 

Os próximos dois meses vou trabalhar. 

E preparare il cuore per il prossimo anno che verrà. 

Globo em frente a Sophia e a cerejeira japonesa no comecinho da Primavera
20/07/2012

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Eu vi Davi di Michelangelo



E como tantas outras vezes na vida, o fato de ser distraída para geografia e detalhes históricos em geral, me proporcionou uma surpresa absoluta.

Fui convidada para ir a um Museu em Firenze. Adoro ir a Museus, em Firenze então, “de grátis”... Porque não? Sim, eu sei que Firenze foi palco de grandes acontecimentos históricos, que é berço de grandes artistas italianos. Que conserva histórias milenares, que boa parte da revolução que culminou na ciência moderna se desenvolveu por aqui e bibibi. Mas eu não fiz essa leitura quando aceitei o convite. Nem me lembrei. Só queria dar uma volta. Sair e ver gente.

No caminho, me disseram: vamos a Galleria dell'Accademia, têm obras de Michelangelo. E eu disse em italiano: ah legal!

Chegamos. Entrei. Cinco estátuas inacabadas do mestre. Muito interessante, têm sua beleza, mas é meio chocante. Porque parece que os homens querem sair de dentro do bloco de mármore, mas estão presos ali. Talvez por isso se chamam “Prigionieri”. Me lembrei da alegoria que Piero Coda fez em aula, explicando a dor e que eu toscamente reproduzo aqui: assim como a estátua precisa surgir de dentro do mármore, também a beleza pode nascer da dor. Um dos prisioneiros era muito expressivo. O braço inacabado por sobre a cabeça parecia fazê-lo suportar um peso terrível.

Eu me perguntava se eram inacabadas por escolha ou não, quando virei a cabeça e meu olhar se deparou com ele. Meu coração se perdeu. E o cérebro meio que travou. Porque precisei de alguns instantes pra associar a visão às informações que tenho registradas e pra acreditar que estava vendo Davi di Michelangelo. Fiquei tão abobalhada que fui me aproximando devagarinho. Sem pressa. Ainda olhando “i prigionieri”, me fazendo de tímida para então finalmente estar diante dele e de seus quase 5 metros de altura.

É majestoso. Seus músculos parecem feitos de carne. Sua expressão é de quem decidiu-se a fazer algo muito sério. Os olhos são marcantes e olham em direções diferentes. Os detalhes das veias nas mãos e no pescoço são quase assustadores. As unhas dos dedos do pé... Na mão direita a pedra que atiraria em Golias e na outra mão, que está apoiada sobre o ombro, segura o estilingue. É perfeito. Michelangelo deve ter chorado quando o viu pronto. Na minha ignorante opinião artística, é ainda mais belo e deslumbrante que Pietà.

Michelangelo levou três anos para concluir a escultura (1501/1504), revelando-a no dia 8 de setembro. Antes dele receber a incumbência dessa obra,o bloco de mármore de carrara de onde surgiu Davi ficou exposto ao tempo por 25 anos no pátio da catedral de Santa Maria del Fiore, e foi danificado a ponto de diminuir de tamanho. Outros escultores já haviam recebido a incumbência da obra mas, por razões diversas, eles não se interessaram. Esse bloco foi rejeitado por grandes mestres como Duccio, Baccelino e Roselino. Michelangelo é considerado nesta obra uma espécie de inovador, pois retrata a personagem não após a batalha contra Golias (como Donatello e Verrochio antes dele fizeram), mas no momento imediatamente anterior a ela, quando David está apenas se preparando para enfrentar uma força que todos julgavam ser impossível de derrotar. Michelangelo neste trabalho usou o realismo do corpo nu e o predomínio das linhas curvas.” (Traduzi de algum site italiano, todo mundo sabe que não entendo nada de arte).

Que homem foi esse capaz de esculpir tamanha beleza. Como e quando foi que descobriu que poderia eternizar as formas humanas no mármore como quem brinca com massinha de modelar. O que pensava a cada obra concluída. Porque optava em não concluir algumas. Será que por um instante teve noção de que sua arte seria eternizada e que um dia uma guria deslumbrada e distraída, que atravessou o Atlântico em busca de seus sonhos, ia se emocionar diante de seus feitos. 

Seja lá quem fostes e o que pensastes Oh! bravissimo Michelangelo, serei eternamente grata por esse instante de beleza. E por reforçar minha crença que é possível sonhar acordada.

domingo, 4 de setembro de 2011

Belezas selvagens da Toscana



Longe de casa há uma semana, milhas e milhas distante... dos meus amores. Segunda-feira termina a mordomia e começam as aulas.

Mas hoje ainda é domingo. Acordei cedo. Encontrei o lugar onde ficam as bicicletas, tinha uma aro 24, perfeita para minhas pernas curtas. De um rosa nada discreto. Testei os freios, afinal seria muita tragédia morrer descendo uma das colinas do Vale do Arno. Não estão assim, uma Brastemp, mas para uma passeio curto e atenta para não pegar nenhuma descida muito íngrime das tantas lombas que têm por aqui, deu pra fazer un bel giro. Já estava com saudades de sentir o vento no rosto quando se desce uma lomba a bordo de uma bicicleta.

De fato, Loppiano é menor que Sinimbú. Mas é maior que a Redenção. As construções são distantes umas das outras. Tem muito espaço. Bastante silêncio. E troppo sole.

O solo está todo rachado. E as rachaduras são fundas. Parece que chove muito pouco por aqui. A grama, além de rala não é verde. E as pontas das árvores estão queimadas do sol.

Mas ainda assim, ao longo das estradinhas, videiras bem verdes e carregadas de cachos de uvas, plantações de oliva, pinheiros variados, pássaros, esquilos; vi um na hora que abri a janela do quarto esta manhã. E ontem a noite, na estrada, um coelhinho tão bonitinho cruzou assustado na frente da van.

Foi a primeira vez que vi um coelho solto. Sem que fosse o bicho de estimação de alguém. E esquilo, até hoje de manhã, só na TV. Ainda tem galos e suas galinhas e muitos pássaros que não conhecia o canto.

Espero sinceramente não ver os javalis. Disseram-se que têm hábitos noturnos e raramente se aproximam de Loppiano. Ahãm. Assim como os mosquitos não fazem nada, só te arrancam os pedaços das canelas. Eu já ouvi ao longe um guincho de porco. Pode saber que depois que escurecer não ponho meu nariz na rua se tiver que andar a pé, tô fora.

Ontem, Lia que já conhece bem as coisas por aqui, levou Valéria, a uruguaia e a mim até Incisa. Eu precisava desesperadamente de repelente e um calmante para passar onde já havia sido devorada. E Valéria queria fazer compras.

Uma bela caminhada morro abaixo, no meio do mato. Estrada em curvas e mato, curvas e mais mato. E o farfalhar das folhas denunciava a presença de alguns vários bichinhos, espero que todos fofos como o coelhinho e o esquilo. No fim da estrada, uma pequena fonte com água fresca era um convite a se refrescar.

Incisa e a região são banhadas pelo Rio Arno. Por isso in Val dall'Arno. Vale do Arno. Me lembrei do Arno Frantz, prefeito folclórico de Santa Cruz do Sul.

Ruelas estreitas. As casas com as portas direto na rua. Muitas escadas para dar acesso as ruas mais altas. Vasos de plantas mesmo nas áreas comuns e aquelas lixeiras novas de Porto Alegre em toda parte. De todas as cores, para todos os tipos de lixo. Inclusive na estrada que só tem mato. Aliás, em Roma também tem. Algumas pichadas e depredadas. Parece que vândalo maloqueiro não é exclusividade do terceiro mundo.

Vi carrinhos tão pequenos que parecem de brinquedo. Esperava o instante que ia dar de cara com o Mr. Bean, apesar de saber que ele não mora na Itália.

Estava preocupada de acabar engordando, já que o sorvete, a massa, o pão, o queijo e o vinho são deliciosos. Mas se toda vez que eu precisar de repelente ou qualquer outra coisa, tiver que ir a Incisa. Vou ficar magra como a Gisele Bünchen. Só não posso, toda vez, passar na sorveteria como fiz ontem, porque neste caso vou ficar igual ao Wagonho, mais conhecido por Wagner Machado :o)

p.s. 1 A janela do meu novo banheiro é tão grande que posso fazer cocô admirando as belas colinas toscanas; especula-se que são as mesmas pintadas por Leonardo ao fundo da Monalisa, mas eu não achei parecida.
p.s 2 a guria das Filipinas cantarola shimbalaiê... e alguma alma iluminada mostrou funk pra ela. Pobrezinha...

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Da Porto Alegre fino a Loppiano



Cheguei. Tudo certo. Melhor impossível. Minha companheira de vôo era proprio una italiana. Ma dai, sono fortunata perché ho cominciato a provare il mio italiano dell'aereo.

Passar em Lisboa, uma belezinha. Tutto a posto. É como estar em um aeroporto em casa. Publicidade do Banco do Brasil. Todas as placas escritas com a última flor do Lazio. Nenhum atraso. Perfeito. A Italiana seguiu no mesmo vôo fino a Roma.

Chegando em Roma, a brincadeira começou.

Dá pra acreditar que o carrinho do aeroporto em Roma tem que pagar? Dois euros. D O I S. Ccoloca-se uma moeda e o carrinho é liberado.

Tinha duas notas de 100 e uma de 50. Zanzei o aeroporto todo tentando uma ajuda pra trocar as notas até que uma santa criatura resolveu facilitar minha visa e me contou um grande segredo: tem uma máquina ao lado dos carrinhos que troca as notas. Muito moderno. Dei pra ela uma nota de 50 (as de 100 ela não quis, não devia estar com tanta fome) e ela me devolveu várias notinhas de 5 e moedinhas de euro. Com uma das moedinhas de 2, finalmente peguei, feliz, o meu carrinho.

Sim, porque com 64gk de bagagem era impossível sem carrinho. Eu já tava ficando nervosa quando descobri que era uma coisa tão fácil...

Passei pela Adogana. Super tranquilo, depois de tantas recomendações... até me admirei. O policial até fez graça e me desejou uma ótima estada além de elogiar meu italiano, aliás todos elogiam meu italiano, não acreditam che é la prima volta que vengo in italia. São todos queridos e simpáticos. Eu me ouço, so che non'è così buono.

Depois, fui tentar fazer uma chamada internacional. Avisar que cheguei, viva. Esqueci que eram dois zeros. O ordinário do telefone me comeu 3 euros sem completar a chamada e não devolveu as moedas. Tudo bem, na próxima ele me paga. Gastei 55 euros pra chegar a Grottaferrata. 50 pra senhora que me trouxe, 2 pelo carrinho e 3 no orelhão mangiatore di moneta. Liguei porque fiquei tensa. Não tinha ninguém me esperando. Mas depois respirei fundo e esperei, a senhora que foi me buscar logo chegou. Fiquei tensa e gastei 3 euros a toa. Bobalhona.

Fui pra Grottaferratta, a região dos castelos de Roma. Sabe aquelas ruelinhas dos filmes? Lindo... Mas castelo mesmo não vi nenhum. A senhora me explicou que eles ficam mais longe. Põe longe nisso...

Depois, lendo as placas, me dei conta que é a Região do Lazio. Aquela do poema do Olavo Bilac e a última flor bela e inculta.. Fiquei pensando que a nossa língua nasceu por aqui. E veja onde ela foi parar. Olha o que os portugueses fizeram com ela...

Já cheguei em clima de festa. Daiana, uma brasileira que eu já conhecia e mora aqui há um ano, estava de aniversário. A Iolanda me disse pra dizer a ela que eu era o presente enviado de Porto Alegre. Depois que ela abriu os outros presentes não é que eu disse mesmo. Parece que ela gostou.

Mais tarde quem ganhou o presente fui eu: o melhor gelato di pistacchio che già ho preso. Impressionante como sorvete italiano é bom. Nossa. Sem falar na recepção. Foi como chegar em casa.

Uma coisa que me impressionou já na chegada: a mistura de cultura. Nesta festa pra Daiana haviam representantes de outras nações: Filipinas, Hungria, Brasil, Itália.

No almoço do dia seguinte, no apartamento da Daiana, Atle e Andi éramos 7 gurias e 5 nações: Brasil, Hungria, Filipinas, China, Twaian e Algéria. E o jantar, festivo em comemoração ao fim do Ramadás, porque a algeriana é muçulmana. E ela provou meu chimarrão. Tomou até a cuia roncar. E repetiu.

Fiz umas boas caminhadas por Grottaferrata. Fui a missa. Non ho capito niente. O padre fala muito rápido, meio pra dentro. Só entendia quando ele dizia: Nel nome del Padre e del Figlio e dello Spirito Santo, amen.

As gurias me receberam de um modo tão especial que nem me dei conta que estava tão longe de casa. Na última noite me levaram pra ver um show na praça. Chegando lá encontramos uns amigos e um deles era uruguaio. Portava o seu Tererê. Não acredito que tive que atravessar o Atlântico pra experimentar o famoso Tererê. E não é que é bom?

E falei tanto no tal gelato que me levaram a uma gelateria artesanale. Nossa. Fiquei doidona. Era tanto sabor que eu não consguia escolher. Cada nome. A senhora da gelateria era veramente simpática e paciente. Porque eu fiz una vera bagunça ali... Minha mãe teria dito: filhaaaaa, te comporta.

Novos amigos, um mais simpático que o outro. Noite agradável. Sentada no meio fio, tomando um sorvete. È stata una bella serata. Na manhã seguinte parti para Sophia. Sou tão sortuda que uma senhora, Gabri, estava em Grottaferrata de carro e iria pra Loppiano no mesmo dia que eu. Eita!

Cheguei em Loppiano um pouco antes das 11h. Como sempre fui muito bem recebida. É como chegar na casa de um parente que não te vê a tempo, mas tem carinho por ti.

No caminho, plantações de oliva, uvas, girassóis e meu velho conhecido fumo. Eu o reconheci da estrada. Tá com flores, me deu saudade...

Fui recebida por Samar, da Jordânia. Está aqui há um ano. É minha veterana. E pouco depois conheci Lia, do Paraquai. Seremos colegas de classe.

Moraremos em sete gurias em um amplo e aconchegante apartamento. O tamanho da mesa da cozinha deixaria com qualquer nonna orgulhosa. Não sei quantas pessoas podem sentar-se. É imensa.

Pelo que vi de Loppiano na chegada e da janela do meu quarto, é menor, muito menor que Sinimbú. Talvez um pouco maior que a Redenção. Amanhã descubro. Mas hoje já descobri que tem muitos bichinhos que gostam de picar. Não sei se são mosquitos. Devem ser. To virada em bolotas.

Mas em compensação Samar é uma excelente cozinheira. O jantar, com a presença de 4 nações: Jordânia com Samar, Paraguai com Lia (que também trouxe Tererê e ficou feliz da vida com meu chimarrão), Itália com Tomazzo e Brasil comigo, rendeu muito papo.

O incrível é que todas essas pessoas, de tantos países diferentes parlano italiano. Amanhã chegam Uruguai, Filipinas, Brasil e tantos outros...

Por enquanto estamos sem compromissos. Com tempo pra arrumar as coisas, habituar-se ao ambiente, conhecer a casa e umas as outras. Segunda-feira começam as aulas de italiano.

Buonanotte!

p.s. 1 meu chimarrão não fica tão bom com a água daqui. Não faz aquela espuminha de chimarrão novo. Parece sempre lavado.
p.s. 2 comprei um hidratante. Se no Brasil usava uma ou duas vez por inverno quando a consciência pesava e achava que tinha que dar uma mão pra natureza, aqui tenho que passar sempre que saio do banho. Acho que vou tomar menos banho...
p.s. 3 não gostei da água. Não vejo a hora de não perceber mais o sabor.

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Il Colosseo e io


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Ontem foi um dia e tanto. Decidi ir a Roma sozinha. Daiana, uma brasileira fofíssima que está aqui há um ano, me fez uma merenda pra que eu não precisasse comer na rua e gastar meus muitos euros.

Um ônibus, um metrô, 1h e basta para chegar a sede do Antigo Império Romano. Fui contando as estações para não passar do ponto. Eram tantas e com nomes tão engraçados. De Agnanina a Otavviano são 21 estações. Deu pra observar muita coisa neste meio tempo.

Contastação mais importante: metrô é lugar de gente doida, aqui ou no Brasil. A diferença é que a gente doida daqui não fala português, e nem sempre italiano. Tirando o fato de que o trem é bonitão, novinho, bem limpo e organizado, o resto é igual, só que com uma boa pitada de diversidade cultural:

A doida que fala sozinha e faz caras e bocas e parece que está falando contigo, vestia uma daquelas roupas de alguma tribo africana e o que ela balbuciava e as vezes cantarolava era inintelígivel. Quem sabe alguma das milhares de línguas que existem na África.

O tio que grita com tudo que se mexe, mas com ninguém em especial, grita em italiano. Que esforço que fiz pra não fazer cara de apavorada.

E a dupla que pede esmola entra no metrô com uma caixa de som com rodinhas e um microfone. Muito moderno. É um espetáculo bonito de ser ver. Nada de “podia estar matando, podia estar roubando, mas estou aqui pedindo...” A primeira dupla deviam ser mãe e filha. A mãe cantava uma canção italiana e, eu acho que ela era do oriente médio, e a filha passava o copinho. Na viagem de volta, a dupla era de dois guris com uma gaita cada, estilo Dominguinhos, e o mais novo passava o copinho. Um detalhe interessante: o copinho das duas duplas era do MacDonald's. Me pareceu um símbolo do capitalismo.

As estações, na maioria, vendo-as de dentro do trem, eram bem bonitas, limpas e organizadas. Mas a estação terminal me decepcionou. Toda pichada, feia e mal cuidada. Na vigésima primeira eu saltei. Otavviano. Bonitinha. Quando voltei a superfície, estava em Roma. Munida de um mapa, parei na saída do acesso ao metrô e olhei em frente, meu primeiro destino era a Piazza San Pietro. Um ragazzo muito atencioso (e eu bem ligada) me perguntou se queria uma ajuda. Perguntei se pra chegar a Praça São Pedro era só seguir aquela rua reto e o guri: tu sei brasiliana oppure portuguesa? Pô, sacanagem, só porque na hora de falar dritto eu disse reto.

No caminho a Praça tem as mesmas coisas que no Brasil: camelôs, mendigos de pé torto, ou sem braço, ou bem velhinho pedindo dinheiro. Quem disse que na Europa não tem ambulante, mendigo e espertalhão? Mentiram pra mim. É verdade que eles falam inglês, francês e tantas outras línguas, mas continuam sendo mendigos, ambulantes e espertalhões.

Impressionante a quantidade de turistas. Ouvi tantos idiomas e vi tantas etnias diferentes que não poderia contar. Grupos de turistas, com sua guia e os radinhos pra acompanhar tudo o que ela dizia, lambuzados de protetor solar, enrolados em panos escrito: Italy/Roma. Coisa horrível. Adorei estar sozinha, podendo observar tudo ao meu tempo. Sem aquela loucura de consumir tudo que se ve pela frente. As pessoas mais interessadas nas vitrines e nos produtos dos ambulantes do que naquelas paredes seculares. Deu vontade de gritar: Alou pessoas, bugigangas tem em qualquer parte do mundo, história cada lugar tem a sua.

De repente, estava eu lá, no meio da Piazza San Pietro. De frente para as escadas que tem seus degraus construídos com pedras removidas do Colosseo, até que o tal Papa da época mandou parar, porque se deu conta que desse jeito, a Catedral acabaria com o monumento dos Imperadores Romanos. Muito sábio esse Papa. Não sei da onde tiraram o resto das pedras...

A praça é grande, tem duas fontes e ao lado de cada uma, uma pequena fonte com água que se pode tomar. Ela cai numa grande bacia de mármore, como se fosse uma bica. Juro que ouvi alguém dizendo: que pia bem grande (mas não identifiquei o brasileiro espirituoso). Eu ainda to com a minha garrafinha Fonte Ijuí que comprei no aeroporto com os últimos 4 reais que a mãe me deu justo pra isso. Enchi ela com a água do Papa. A água aqui da Itália é diferente. Gosto mais da do Brasil. Mas enfim, bebi água das fontes, várias vezes, sempre trocava a água da garrafa por uma mais fresca. Achei lindo isso.

Para entrar na Igreja tem uma fila monstra. É preciso passar pelo detector de metais. Ficar parado no sol. Ter paciência. Enquanto esperava observei aquelas colunas imensas que formam um semi círculo ao redor da Praça. E a parte externa da Igreja também é linda e cheia de detalhes. Sem falar nas pessoas. Observar pessoas sempre foi um prazer pra mim, mas assim com essa diversidade étnica, ficou ainda mais interessante.

Perguntei duas vezes aos guias e policiais se precisava pagar para entrar em alguma parte da Igreja. Não precisava. Primeira fila vencida. Achei um guarda-volumes, larguei minhas coisas e lá fui eu pra segunda fila. Enorme... na porta lateral da Igreja, mas do lado de dentro (como se fosse o hall de entrada, portanto sem sol). E no meio, tudo liberado. Alguma coisa me dizia que algo estava errado. Mas, fiquei ali. Quando, 30 minutos depois, cheguei no fim da fila descobri o que havia de errado: para chegar a cúpula da Igreja paga-se 5 euros pra subir os 300 e não sei quantos degraus ou 7 euros pra subir de elevador. Pô eu perguntei. Meus muitos euros estavam na mochila. Ok. Nem queria mesmo subir na cúpula e ver todo o panoroma de Roma. Deve ser bem feio.

Finalmente entrei na Igreja. Nossa. Uau. Fenomenal. Dei de cara com ela: Pietà. Ali. Há dois passos, com Cristo no colo, branca como uma nuvem. Divinal. É lindo. Perdi o fôlego.

E aqueles turistas malucos vá tirar fotos. Nessas horas fico orgulhosa de mim por não ter essa compulsão de ver tudo através de uma lente artficial só pra poder mostrar pros outros onde fui. Duvido que aquela gente toda, naquele desespero de achar o melhor ângulo, em algum momento parou e olhou pra ela. A mais bela obra de Michelangelo. Imóvel, esperando ser admirada. Como esse cara fez aquela escultura? Com tamanha perfeição. Parece que ele derreteu mármore e jogou sobre duas pessoas, para conseguir aquelas formas tão perfeitas.

No centro da igreja, em cada parede, a cada passo que se dá, impossível descrever o que se vê. É tudo de uma proporção colossal. De uma perfeição de formas. De uma beleza de cores. Eu nunca vi nada igual. Fiquei diante daquilo tudo tentando entender mas afinal, como é que aquela gente fez tudo isso. Sem tecnologia avançada. Sem misturador de cores automatizado. Como foi que penduraram aquelas estátuas imensas? Teoria da invasão extraterrestre?

Eu sei que o homem é capaz de tantas coisas, mas aquela igreja... É a expressão da capacidade criativa do homem. De toda a beleza que ele é capaz de construir. Não vou nem tentar descrever o que vi. Não seria possível.

Mas, me passou pela cabeça que em um lugar como aquele, não me senti, por nenhum momento na casa de Deus. Mas nem por um segundo. Na verdade me senti como num lugar frio e distante. Sem a possibilidade de tocar em nada. Era como quando criança que ia há algum lugar que me parecia tão lindo e cheio de coisas pra explorar e minha mãe me olhava severa e dizia pra não tocar em nada e me comportar.

Enquanto olhava toda aquela grandeza percebi que aquilo tudo foi construído para satisfazer o desejo de grandeza e megalomania do homem. Deus, segundo o que eu entendo por Deus, não precisa de tudo aquilo. Que me perdoem os que acreditam que Deus habita ali, mas não posso imaginar Deus em um lugar tão rico e frio. Cresci ouvindo que ele mora no meu coração, ali com certeza ele não ia querer morar.

Sai de dentro da Igreja e depois da Piazza San Pietro impressionada com que o homem é capaz de construir. Mas nem por um momento emocionada por ter estado na casa de Deus. Não me senti em sua presença nem pelo tempo de um suspiro.

Bom, eu queria ver o Colosseo. Tinha tanta coisa que eu ainda queria ver e enquanto me perguntava qual trajeto e que monumento escolheria, além do Colosseo, avistei aqueles ônibus de turismo, que nem o de Porto Alegre, e que o pessoal fica me zuando porque eu fiz o passeio. Pois bem, 12 euros e duas horas de giro por todos os lugares que queria ver e mais alguns. Ah, paguei. To na Europa. Falo italiano. Tinha só o resto da tarde para estar em Roma. Tenho euros. Fala sério. Adorei andar de ônibus turismo em Porto Alegre que eu já conhecia um pouco, imagina em Roma. E ainda poderia deixar brotar todas as caras de admirada e surpresa que sempre faço sem dar na pinta pros espertalhões que ficam de olho nos turistas bocabertas e desavisados.

Fui. Vi tudo. T U D O. Todas as belezas que Roma guarda nos seus 3 mil anos de história.

Queria poder descrever só um terço do que vi. E senti. E ouvi. Porque ainda tem o maravilhoso serviço de audioguida. Che bel giro che ho fatto! Mamma mia!

E de repente... ali, davanti a me, lui: Il Colosseo.

Eu fiquei de pé. Olhando fixo pra ele. Sem me mexer. Na minha cabeça todos aqueles personagens de filmes romanos e suas carruagens e suas sandálias e as folhas de louro atrás de suas orelhas e a audioguida disse: estamos passando pelas mesmas ruas onde passavam os grandes conquistadores do Império Romano. Falou do grande incêndio de algum ano que terminava com 64 sei lá se antes ou depois de Cristo e que quase destruiu a outra construção que se encontra com ele. E eu vi Nero e sua cara de louco espiando em uma das grandes colunas e todas aquelas ruínas e no alto um avião passando acima dele e as lágrimas rolaram pelas minhas bochechas.

Fui tomada por uma emoção que nunca havia sentido. Eu estava diante do Colosseo. Em cima de um ônibus aberto. Viajei no tempo.

Quando voltei a Piazza San Pietro, caminhava como se não pudesse comigo mesma. Os óculos escuros me ajudavam a disfarçar a perplexidade nos meus olhos. Não era capaz de ver mais nada. Nem a Fontana di Trevi que não se pode chegar de carro e eu queria tanto ver. Nada. Eu não poderia absorver nem mais uma informação. Estava cheia. Transbordando. Uma sensação de peso e de leveza ao mesmo tempo. Fui andando vagarosamente pela Via Otavviano, até o metro.

A caminhada me fez bem. Consegui relaxar. Comprei meu gelatto, sentei em um banco. Olhei pro céu e me dei conta que havia realizado mais dois grandes sonhos meus: estar diante do Colosseo e prendere un gelato seduta a un banco a Roma.

p.s. 1 meu cabelo está um espetáculo. Parece que vou ao cabeleireiro todo dia.
p.s. 2 as ambulâncias da Província de Roma parecem um Tarzan desesperado.
p.s. 3 diálogo com uma italiana:
  • Patricia, tu conhece, Brasília?
  • Sim, é linda. Adoro Brasília, é toda planejada, com muitos espaços vazios.
  • Deve ser muito moderna né?
  • Não, é velha, tem cinquenta anos.
    A italiana riu de mim. Depois do meu passeio em Roma entendi porquê.